A MULHER DO PADRE

         Maria Amara nunca fora bonita, mas tinha um quê de especial que ninguém sabia explicar. É bem verdade que seu corpo moreno e esguio não era de se jogar fora, mas seu rosto tinha traços pesados e vulgares, apesar dos olhos, de um verde que causava cobiça. Era a janela da alma mais linda que já vi. Seu andar requebrado remexia suas ancas, arrancando suspiro dos bebuns nos botecos e calafrios aos homens “de respeito” da cidade. Todos queriam ter um momento de prazer ao lado de Amara, mas ela dava-se ao respeito e saía somente com quem lhe pagasse bem, tinha planos e precisava engordar sua conta bancária.
         Certo dia, chegou à cidade um velho marinheiro aposentado, sem filhos, nenhum herdeiro, pisando macio e feliz como pássaro fora da gaiola. Maria Amara não perdeu tento e logo encontrou um jeito e de ser-lhe apresentada. Conversa vai, conversa vem ficaram amigos e começaram a sair juntos, o velho, sem saber nada de seu passado, confiava em Amara e começou a gostar dela. Ela, por sua vez, fazia-se de santa e por respeito devido ou troca de favores ou por medo de terem os nomes sujos, ninguém se atrevia a falar de sua conduta para o velho senhor Cavalcanti.  Apesar do ciúme que muitos sentiam porque agora ela não saía com mais ninguém a não ser com o capitão Cavalcanti, a quem devotava seus carinhos.
         Numa bela manhã de primavera a cidade surpreendeu-se com a viagem do casal, iriam para a capital onde assinariam um contrato de casamento. Desde então, ficaram fora da cidade por cerca de cinco anos, os quais foram dedicados a operações plásticas e ginásticas aeróbicas, onde Maria Amara passou de lagarta à borboleta.
         De volta à cidade, quase não fora reconhecida. Odiada pelas mulheres tornou-se ainda mais desejada pelos homens. Sempre bem vestida, comportando-se decentemente, honrou o então seu marido até os últimos dias de sua vida. A morte do capitão ocorreu naturalmente, por velhice ou talvez por não suportar tantas carícias e o fogaréu da esposa, mas de qualquer modo, morrera feliz.
         Após quatro anos de luto, a linda borboleta sentia novamente vontade de voar, muito embora já não precisasse ganhar dinheiro pelo vôo. Queria sentir-se desejada, isso a fazia feliz e sem perceber já era objeto de desejo dos mais ricos senhores da cidade, porém, resistiu o máximo possível.
         Tentando tirar da cabeça esses pensamentos mundanos, Amara decidiu que iria confessar-se e pedir perdão pelos pensamentos que queimava-lhe a alma. Vestiu-se de modo discreto e caminhou para a igreja, ao confessar-se com o padre sentiu uma vontade enorme de olhar em seus olhos, sua voz a absolvendo dos pecados casou arrepios na espinha. Mas o confessionário não permitia que o visse. Saiu e foi sentar-se no banco esperando a missa, logo a igreja encheu-se de fiéis e a missa iniciou-se as sete em ponto. No altar, um padre novo substituía o vigário que estava de férias, Amara sequer rezou. Não conseguia tirar os olhos do padre enquanto um fogo de desejo queimava-lhe secretamente.  Percebendo a insistência de seu olhar, o padre não conseguiu fazer o sermão com tranqüilidade, olhando de soslaio de vez em quando para ela. No fim da missa saiu rapidamente da igreja sem olhar para os lados, fugindo daquele olhar desconcertante.
         Já em casa, Amara não tirou o novo padre da cabeça e sentia um desejo imenso de tocá-lo, sentir seu cheiro mais de perto, esfregar-se nele literalmente. Na casa paroquial, o padre sentia-se culpado, inquieto e rezou muito se penitenciando. Mas de nada adiantou, seus pensamentos estavam voltados para aquela moça de olhar misterioso e lascivo.
         Na manhã seguinte e nas outras que se sucederam Maria Amara esteve presente em todas as missas devorando o padre com seu olhar. Até que, numa dessas manhãs, no final da missa, fingiu um desmaio e foi levada à sacristia. Padre João, que já estava de saída, foi chamado pelo coroinha e veio em socorro da fiel desfalecida, ao vê-la ficou pálido e, desconcertado, pediu que chamassem um médico. Ouvindo isso Amara fingiu recobrar a consciência, dizendo que já sentia-se melhor e só queria um copo de água. O coroinha foi buscar a água e ela pôde ficar a sós com o padre, segurou em sua mão e pediu que a perdoasse por estar desejando-o. Num impulso, padre João, afastou-se dela e pediu-lhe que rezasse muito.
         O vigário retornou de suas férias e por obra do destino padre João continuou ajudando-o nas celebrações, pois há muito o vigário precisava de um ajudante para atender às paróquias do município. Aproveitando-se disso e já perdidamente apaixonada, Amara usou todas as armas que conhecia para seduzir o padreco, que já não conseguia esconder o desejo de estar junto dela e mais uma vez, ela surpreendeu a cidade, casando-se com o padre, que abandonou a batina por amor.

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