ATAÚDE FURADO

        Pobre vive porque é teimoso! Ultimamente, até depois de morto tem que ser teimoso também, do contrário corre o sério risco de não ser enterrado.

         Hoje presenciei uma cena bastante incomum e sinistra, que sucedeu a uma velhinha do asilo onde faço visitas semanalmente, a infeliz morrera de velhice. Abandonada pelos filhos viera morar no asilo quando completou setenta anos, desde então, nunca mais os viu; ontem ganhou um presente de grego, completou noventa e sete anos e ganhou de presente a morte. Nenhum filho foi localizado para providenciar o féretro, mas a pobre coitada não poderia esperar, tinha que ser enterrada e o asilo não tinha dinheiro para as despesas. Conseguiram, a muito custo, um caixãozinho doado pelo dono da padaria que costumava doar pães para os velhinhos todos os dias.

         Enquanto os funcionários do asilo corriam atrás do caixão, a defunta esperava, sem pressa. Enfim, o tão esperado ataúde chegou, arrumaram a velhinha e não perderam tempo, foram rapidamente para o cemitério, na saída do asilo o caixão soltou o fundo e, por pouco, o corpo não caiu no chão. Tiraram a velhinha e repregaram o fundo, foi rápido o serviço, usaram os mesmos pregos.

         Já na entrada do cemitério, a tampa do caixão abriu na hora de descer da caminhonete e a pobre anciã defuntinha caiu no chão de bruços, arrumaram-na outra vez e caminharam em direção ao túmulo reservado para indigentes que ficava na parte dos fundos do campo-santo.

         Caminhavam todos em silêncio, de repente ouviu-se um barulho de madeira estalando, verificaram o fundo do caixão e puderam perceber que o mesmo estava rachando, a velhinha era leve, mas àquela altura já estava muito inchada e pesava no frágil caixão. Apressaram o passo e, com sorte, conseguiram chegar à cova sem mais contratempos. Finalmente a velhinha pôde descansar em paz.

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