O ALBINO (Crônica)
Vivi toda minha infância num sítio, era meu
paraíso, onde a natureza verdejava e os pássaros faziam festa. Meu pai tinha
algumas pessoas que o ajudavam, mas entre tantos empregados, um chamou-me a
atenção, era uma figura estranha. À primeira, vista senti medo dele, pois tal
visão nunca antes havia se instalado em minhas retinas. Depois, com o tempo,
fui habituando-me àquele sujeito intrigante, porém, simpático.
Sua pele muito branca, de um branco estranho, deixava-me curiosa, seus
cabelos avermelhados brilhavam ao sol, lembrando um trigal, ou um canteiro de
macelas ceifadas e expostas ao sol, secando. Suas sobrancelhas e todo o pêlo do
corpo também apresentavam aquele dourado magnífico, seus olhos muito claros
pareciam não serem adaptados ao sol, pois em dias muito claros, cerravam-se
evitando a luz forte. Eu o observava em todos os detalhes, era um homem de baixa estatura, possuía grandes pés achatados por andar a pé e, descalço. Andava léguas até chegar ao nosso sítio. Apesar de ter uma estética imperfeita era uma pessoa amável e dono de um sorriso cativante. Era um bom limpador de brejos o Mané Ruço. Assim é que era conhecido naquela região, na verdade acho que ninguém sabia seu verdadeiro nome, vivia sozinho numa casinha à beira da estrada.
Minha curiosidade era grande, estava sempre perguntando a um e a outro o porquê do Mané ser assim. Minha mãe dizia que ele era aça, mas essa explicação não satisfazia minha curiosidade. Então, criei duas hipóteses para responder a meus questionamentos, a primeira foi que por ele limpar muitos brejos e ficar muito tempo dentro d’água devia ter desbotado; a segunda dizia respeito a seu sangue. Na minha inocência pueril, eu achava que seu sangue não fosse vermelho como o das outras pessoas.
Eu o admirava, apesar de tudo. Pois o trabalho dele deixava o brejo limpinho e suas águas refletiam o céu com mais perfeição. Num desse dias de limpeza, Mané Ruço chegou cedo com sua foice afiadíssima que me causava arrepios de medo, logo se pôs a trabalhar, estava já na metade do serviço quando, de repente, soltou um grito assustando não só a mim, mas também a meus irmãos, que a título de curiosidade, acompanhavam-me à beira do brejo; Mané Ruço agachou-se dentro da água e tirou de lá um grande caco de vidro que o havia ferido, saiu da água com uma expressão assustadora, fomos correndo para casa.
Não demorou muito, ele também chegou pedindo um pedaço de pano para atar o ferimento. Foi aí que minha segunda hipótese caiu por terra, pude constatar, através do corte, que seu sangue era vermelho, totalmente normal. Então, fiquei com a primeira hipótese.
Muito tempo depois descobri que ele era especial e raro. Há muito faleceu, mas vive em minha memória. Ainda hoje posso sentir seu cheiro e, se sua cor não foi ocasionada pelo contato prolongado com a água do brejo, seu cheiro provavelmente tenha sido.
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